Presidente afirmou que gravação de conversa com empresário Joesley Batista foi ‘manipulada’ com objetivos ‘subterrâneos’. Ele fez segundo pronunciamento em três dias.
O presidente Michel Temer afirmou nesta sábado (20), em pronunciamento de 12 minutos e meio no Palácio do Planalto, que ingressará no Supremo Tribunal Federal (STF) com um pedido de suspensão do inquérito aberto com autorização do ministro Edson Fachin para investigá-lo por suspeita de corrupção passiva, obstrução à Justiça e organização criminosa.
O pedido foi protocolado por volta das 16h, depois de concluído o pronunciamento.
Ele também afirmou que não deixará a Presidência da República.
“Digo com toda segurança: o Brasil não sairá dos trilhos.
Eu continuarei à frente do governo”.
Na noite de 7 de março deste ano, Temer recebeu o empresário Joesley Batista, dono do frigorífico JBS, na residência oficial do Palácio do Jaburu.
O empresário registrou a conversa com um gravador escondido e depois apresentou a gravação a investigadores da Operação Lava Jato, da qual se tornou delator.
No pedido de abertura de inquérito ao STF, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou que a conversa indica “anuência” de Temer ao pagamento de propina mensal, por Joesley, para comprar o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), preso em Curitiba pela Operação Lava Jato.
“Li hoje no jornal ‘Folha de S.Paulo’ notícia de que perícia constatou que houve edição no áudio de minha conversa com o sr. Joesley Batista.
Essa gravação clandestina foi manipulada e adulterada com objetivos nitidamente subterrâneos.
Incluída no inquérito sem a devida e adequada averiguação, levou muitas pessoas ao engano induzido e trouxe grave crise ao Brasil. Por isso, no dia de hoje, estamos entrando com petição no Supremo Tribunal Federal para suspender o inquérito proposto até que seja verificada em definitivo a autentiticidade da gravação”, declarou o presidente.
Logo após o pronunciamento, o advogado Francisco Assis, que participou do acordo de delação da JBS, afirmou que não houve edição do áudio e divulgou a seguinte nota:
“O áudio reflete uma gravação amadora feita por Joesley, tem 38 a 40 minutos, foi o tempo contando entrada e saída do local.
Não há absolutamente nenhuma edição.
Temos cópia do material original, está sendo mantida em local seguro.
Entendemos o argumento da defesa de questionar, mas lembramos que Temer não nega a reunião e nem os assuntos tratados.
Pretendemos fazer uma perícia própria e de forma alguma nos opomos a uma pericia.
Só esperamos que o governo não use o sistema para tentar anular o áudio.”
Principais trechos
Leia abaixo declarações do presidente durante o pronunciamento:
Voltou a chamar a gravação de clandestina:
“Essa gravação, clandestina, é o que se diz, foi manipulada e adulterada com objetivos nitidamente subterrâneos, incluída no inquérito sem a devida e adequada averiguação, levou muitas pessoas ao engano induzido e trouxe grave crise ao Brasil.”
Criticou Joesley Batista:
“O autor do grampo está livre e solto, passeando pelas ruas de Nova York.
O Brasil, que já tinha saído da mais grave crise econômica de sua história, vive agora, sou obrigado a reconhecer, dias de incerteza. Ele não passou nenhum dia na cadeia, não foi preso, não foi julgado, não foi punido e, pelo jeito, nao será.”
Criticou os que o querem fora do governo:
“Há quem queira me tirar do govenro para voltar aos tempoos em que faziam tudo o que queriam com o dinheiro público e não prestavam contas a ninguém.
Quebraram o Brasil e ficaram ricos.”
Disse que a JBS lucrou milhões:
“Antes de entregar a gravação, [Joesley] comprou US$ 1 milhão porque sabia que isso provocaria caos no câmbio.
Sabendo que a gravação também reduziria o valor das ações de sua empresa, as vendeu antes da queda da bolsa.
Não são palavras minhas apenas.
Os fatos estão sendo investigados pela Comissão de Valores Mobiliários.
A JBS lucrou milhões e milhões de dólares em menos de 24 horas.”
Negou ter agido para beneficiar a JBS:
“O autor do grampo relata dificuldades e eu simplesmente as ouvi.
Nada fiz para que ele obtivesse benesses do governo.
Não há crime em ouvir reclamações e me livrar do interlocutor indicando outra pessoa ouvir suas lamúrias.
E confesso que o ouvi como ouço empresários, políticos, trabalhadores, intelectuais e pessoas de diversos setores da sociedade no Palácio do Planalto, no Palácio do Jaburu, no Palácio da Alvorada e em São Paulo.”
Disse que não comprou o silêncio de ninguém:
“Quero lembrar da acusação de que eu dei aval para a compra de um deputado.
Não existe isso na gravação, mesmo tendo sido adulterada.
E não existe porque eu não comprei o silêncio de ninguém.”
Reafirmou que não tentou obstruir a Justiça:
“Nunca comprei o silêncio de ninguém, não obstruí a Justiça porque não fiz nada contra o Judiciário.”
Disse acreditar nas instituições:
“Tenho crença nas instituições brasileiras e nos seus integrantes.
Devo registrar que é interessante quando os senhores examinam os depoimentos, os senhores verificam que a conexão de uma sentença a outra diz:
‘Estou comprando o silêncio de um deputado e estou dando dinheiro a ele’.
A frase é ‘Estou me dando bem’, e eu digo:
‘Mantenha isso, viu?’.
Por isso, devo dizer que não acreditei na narrativa do empresário de que teria segurado juizes etc.”
Disse que Joesley é um “falastrão”:
“Ele [Joesley] é um conhecido falastrão, exagerado.
Depois, em depoimento, podem conferir, disse que havia inventado essa história, que não era verdadeira.
Era fanfarrosnice que ele utilizava naquele momento.”
Concluiu dizendo que continua no cargo:
“Digo com toda segurança: o Brasil não sairá dos trilhos.
Eu continuarei à frente do governo”.
Pronunciamento anterior
Na quinta (18), Temer já havia feito um pronunciamento à imprensa, sem responder a perguntas de jornalistas, no qual disse que não renunciará ao cargo.
Joesley e Wesley Batista, além de Ricardo Saud, diretor da J&F, fecharam acordo de delação premiada com o Minsitério Público e entregaram aos investigadores da Lava Jato documentos, fotos e vídeos como prova das informações.
As delações já foram homologadas pelo Supremo Tribunal Federal.
O sigilo das informações foi retirado e o conteúdo, divulgado.
Em razão do que foi apresentado pelos delatores, o ministro Luiz Edson Fachin, relator da Lava Jato, autorizou a abertura de um inquérito para investigar o presidente.
Serão apurados os crimes de corrupção passiva, obstrução à Justiça e organização criminosa.
Segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, Temer e Aécio Neves (PSDB-MG) agiram em conjunto para impedir o avanço da Lava Jato.
No caso de Aécio, o tucano foi afastado do mandato de senador por determinação do Supremo.
A irmã dele, Andrea Neves, e um primo, Frederico Pacheco, foram presos pela Polícia Federal.
Presidente nacional do PSDB, Aécio se licenciou do cargo na última quinta.
Acusações
Relembre abaixo algumas das acusações envolvendo o presidente Michel Temer:
‘Anuência’ para propina a Cunha;
Ajuda a Cunha com ‘um ou dois ministros’ do STF;
Recebeu R$ 15 milhões e ‘guardou’ R$ 1 milhão;
Pediu a Aécio para retirar a ação no TSE;
Respostas
À medida em que o conteúdo das delações era conhecido, o G1 questionava a Presidência sobre as acusações.
Leia abaixo:
Ajuda Cunha:
“No diálogo com Joesley Batista, o presidente Michel Temer diz que nada fez pelo ex-deputado Eduardo Cunha.
Isso prova que o presidente não obstruiu a Justiça.
Michel Temer não recebeu valores, a não ser os permitidos pela Lei Eleitoral e declarados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Portanto, não tem envolvimento em nenhum tipo de crime.”
Ação no TSE: “Isso não ocorreu”.
Atuação para impedir Lava Jato: “O presidente nunca atuou para impedir o avanço da Lava Jato”.
Recebeu R$ 15 milhões e guardou R$ 1 milhão: “O presidente não pediu nem recebeu dinheiro ilegal.”
Reações
Desde que o conteúdo das delações da JBS se tornou público, houve uma série de reações contra o presidente, tanto no Congresso Nacional quanto em setores da sociedade civil.
Parlamentares de oposição, por exemplo, passaram a liderar um movimento a favor do impeachment de Temer.
Além disso, segundo informou o colunista do G1 e da GloboNews Gerson Camarotti, articuladores políticos do governo já foram avisados que integrantes da base aliada querem a renúncia do presidente.
Na última quinta, também foram registrados protestos contra Temer em 29 cidades de 21 estados e do Distrito Federal.
Nos últimos dias, também têm sido organizados atos em frente ao Palácio do Planalto para pedir a saída de Temer da Presidência.
Fonte: G1